quinta-feira, agosto 03, 2006
O criador de galinhas
Emmanuel, economista, 40 anos, primogênito e carnívoro, em uma tarde singela de terça-feira, resolveu criar galinhas. Deu a volta no bairro de bicicleta e entrou no sebo “Os ácaros mais novos da cidade”. Seu indicador nervoso escolhera um título de 1985: “As galinhas dos vizinhos engordam mais?”
Seu conhecimento ovíparo havia se perdido na sétima série, mas prosseguiu, satisfeito, com sua aquisição burlesca literária. Passou no aviário e comprou ½ dúzia de galinhas e um galo preto. Gamão, assim o apelidara.
Na manhã de quarta-feira quebrou o cimento de seu quintal. Não todo, só a parte leste. As aves precisam de espaço para ciscar. Sua mulher Sonia ajudou a carregar os sacos de alimentos dos animais para dentro de casa.
Em um mês, as galinhas multiplicaram. Farturas de ovos, ciscamentos felizes. Emmanuel estava contente. No quadragésimo dia de estadia em sua casa, Emmanuel reparou em seu Gamão. Depois de copular com seu harém de aves, o animal olhava intrigado para sua Sonia. A mulher retribuía o olhar acariciando a crista do bicho.
Teve pesadelos naquela noite, mas na manhã seguinte se acalmou quando o aviário da esquina faliu e os seus fregueses triplicaram.
# Gamão está bem, Sonia. Mas precisamos de outro macho.
# Ele dá conta, Manu.
Emmanuel coçou o bigode ralo. Sonia jogou milho para as galinhas.
Em 3 meses, o aviário particular de Emmanuel ganhou o Selo de Popularidade Local. Ele colocou aparelho nos dentes, detalhes alaranjados, e pagou uma lipo para sua Sonia.
Gamão continuava seu trabalho árduo e Sonia, com seu corpito novo, estava mais completa.
Dia 27 de julho, ao chegar mais cedo em casa, depois de ter sua consulta cancelada devido à erros de horário da recepcionista, pegou Sonia, em sua cama coração, sendo acariciada pelo bico do Gamão. Furioso, Emmanuel agarrou o galo pelo pescoço. Sua Sonia chorava. Balançou tanto a cabeça do bicho, bravejando palavras grosseiras que o osso partiu em dois.
Todas as galinhas soltaram grunhidos medonhos. Sonia tampou seus olhos. As galinhas cercaram Emmanuel. Ciscaram tanto sua pele que ainda na manhã seguinte urubus iam e vinham do céu para o quintal.
Sonia deixou a casa. Virou vegetariana.
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