quinta-feira, novembro 09, 2006

O sujeito que amara o mundo

Ele era um gordo de cabelos enrolados. Apelidaram-no de Cortés. Não haverá exposição de seu nome real por respeito à família.

O sr. Cortés ofereceu muito dinheiro para ir àquela viagem interplanetária. Era seu sonho trabalhar na Nasa, mas ele havia sido reprovado duas vezes em matemática.

Por anos o sr. Cortés almejou seu sonho. O que o levou a transformá-lo em objetivo. Quando o sr. Cortés alcançou o outono de sua vida ele viu pela sua TV Uol wireless que ainda tinha uma vaga para uma viagem de fim de semana a um planeta anão. Seu mantra tinha então chegado a seu estado alfa. Incansavelmente o sr. Cortés repetia fielmente todas as manhães antes de seu pão com ovo: NAM MIORRÔ RENGUE KIÔ.

Agora na frente de seu Mega Mac cinza seu objetivo tornava-se uma possibilidade sólida.

Quando o agente disse sim ao monte de euros expostos em uma escrivaninha que custava dólares, os olhos de sr. Cortés encheram-se de lágrimas.

Ele se viu de volta ao tempo, quando era menino e jogava seu chapéu de cowboy para cima e uivava para o céu de estrelas. Ele agora veria o mundo de cima.

Quando a pressão alcançou o nível apropriado e os turistas interplanetários começaram a flutuar no espaço da nave, o sr. Cortés repetiu uma frase de um escritor há séculos falecido:

# A beleza podia ser tão enjoativa quanto trufas de chocolate.

Graham Greene estava certo. Doía o olho. A beleza da Terra azul no meio de uma imensidão negra trazia agonia ao coração do sr. Cortés.

Ele amava seu mundo. Agora tinha certeza.

Quando pousaram no planeta-anão número 327, o oxigênio entrou no pulmão dos turistas como água com gás.

Mas sr. Cortés estava feliz demais para perceber a hostilidade do lugar. As pessoas se espalharam pelos campos esverdeados, a procura de alguma diversão terrestre. Sr. Cortés ficou parado, admirando a realização de seu sonho.

No topo de um morro, um menininho com olhos vibrantes assoprava bolhinhas de sabão. Sr. Cortés se aproximou. De repente, ao longe, gritos. Mas sr. Cortés estava encantado demais com a cena angelical. Um cheiro de menta vinha da direção do menino. Sr. Cortés sorriu. O menino sorriu de volta.

Entretanto, sr. Cortés não percebeu quando a terceira bolha de sabão, feita por um material corrosivo, atingiu seu estômago. Quando se deu conta tinha um buraco entre as costelas, igual tiro de escopeta.

Sr. Cortés piscou os olhos. O menino também.

Sr. Cortés só teve tempo de dizer:

# Por que garoto? Por quê?

O menino continuou a assoprar as bolhas mortais. Ele não entendia a língua de sr. Cortés. Pertencia a outra cultura.



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