segunda-feira, dezembro 11, 2006

O espelho do príncipe

O príncipe é aconselhado sobre como escolher funcionários, como controlá-los, lidar com petições e queixas dos súditos, como se aconselhar com os mais velhos, como recrutar soldados de diferentes raças. O conselho trata basicamente dos perigos a que se expõe o soberano absoluto. Entretanto, ninguém o aconselha quando ele próprio emite o perigo. Quando a iminência de ficar isolado dos súditos o enlouquece, quando ele fecha a porta e retira o véu do espelho.

Havia um eunuco do período dos abácidas que contava essa história para que o povo apoiasse o soberano em tudo que fosse lícito, mesmo que ele fosse injusto. Segundo ele, o conceito de justiça era relativo ao tempo. O tempo era cronológico ou multidimensional? Circular ou paralelo?

A certeza era um ponto de interrogação em uma oração não subordinada. O príncipe tinha um segredo e segredos são mortais quando revelados.

Ele era um bom guia e pacificador. Só duas guerras ocorreram em seu governo. Uma para colocá-lo ao poder e outra porque queriam derrubá-lo. Ele proclamava a grandeza do Ser que criou o mundo e a baixeza do homem em sua presença. Pedido individual. As preces são pedidos individuais. Egoísmos no auge do desespero.

O príncipe havia se dirigido a seu quarto especial na data de seu motim. Trouxeram o espelho da Pérsia quando seu pai falecera em um outono passado.

Podem tirar tudo de um homem, mas não podem derrubar uma imagem’, seu pai falara antes de se encaminhar para o Jardim Final.

O príncipe nunca se tornaria rei porque seu irmão já o era. Mas naquelas terras o poder do príncipe era maior do que um reinado. O príncipe era escolhido pela nação. A democracia camuflada em fantasia. A globalização de vários pedidos.

Quando o príncipe levou a mão à sua imagem refletida, o tempo deu um salto.

O véu já não mais balançava para a esquerda. Na sala já não havia adereços de palácio. Ele saiu às ruas como homem comum. Dentre as terras, ratos engatinhavam, sedentos e famintos. Os fedentinos tinham as carnes podres expostas em feiras.

# O que aconteceu? – perguntara o príncipe.

# Um louco tirano matou o Príncipe – disse um vassalo.

# Mas eu sou o seu Príncipe.

O vassalo riu.

# Se você fosse o Príncipe não teria essa imagem. Se você fosse o Príncipe saberia que o rei planejava matá-lo.

O príncipe assombrou-se. Correu de volta para o quarto especial. O véu balançava para a esquerda. Quando o Príncipe puxou o véu e desnudou o espelho, o tempo deu outro salto.

Os adereços do palácio pareciam intactos.

Ele rapidamente chamou um súdito.

Meia-hora depois anunciaram que o príncipe ordenara uma caça à cabeça de seu irmão rei. Quem a levasse até ele se tornaria conselheiro pessoal e herdaria moedas de ouro.

Quarenta minutos depois o chão do cômodo especial estava regado a sangue. O véu balançava para a direita.

# Um louco tirano matou o Príncipe, gritava um vassalo entre o povo.



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