quinta-feira, setembro 27, 2007
Pulo do gato
Pichano tinha o pêlo negro que nem graxa líquida. Brilhava entre as 2 listras brancas, simetricamente alinhadas.
Franca acordou sobressalta, pois tivera um sono agitado. Pichano caminhava piscando o olho esquerdo. Era seu cacoete preferido.
Ela tivera a impressão de ver o gato movimentar a boca, mas perdeu o pensamento ao ver como o rabo zebra dele dançava suavemente conforme o funk alto do bar abaixo de seu prédio.
Será que se prendesse um pregador no rabo do felino ele enlouqueceria e perderia o equilíbrio? A malícia subiu-lhe as idéias. Tipicamente humana, ela foi até a lavanderia e pegou o objeto branco, de plástico. Madeira ia ser maldade demais.
O felino passou rapidamente pela porta central do apartamento, parecendo adivinhar o que lhe aconteceria.
Franca notou que a chave não estava na porta. Quem teria saído? Quem teria entrado? Sua mão alcançou a maçaneta.
Trancada.
O felino parecia ter soltado um grunhido malicioso.
Franca apertou e desapertou o pregador. Sentou-se suando e começou a esfregar o objeto branco entre os dedos. Paredes ziguezaguearam. Ela precisava se concentrar no pregador. A pressão do concreto chegava à sua respiração em folgadas inspirações de ar.
Inspirar, expirar, apertar o pregador, desapertar.
O oxigênio a sufocava, uma cólica invadia-lhe o umbigo.
Inspirar, expirar, apertar o pregador, desapertar.
As paredes pipocavam que nem comercial de guaraná.
O cacoete de Pichano parecia bolinha de pinball, sempre distante.
Mas lá longe, ela viu um brilhinho. A janela abriu-se e ela teve forças para entortar a cabeça e ver o pulo do gato. Ele estava puxando os bigodes sim!
Franca concentrou-se no objeto branco. Apertar, desapertar, apertar, desapertar.
Caminhou até a janela.
Pulou.
Pulou 3 vezes pedindo ajuda a São Longuinho.
Pichano voltou para o interior do apartamento com o cacoete no olho direito e ajeitou-se no sofá. Franca acompanhou o movimento e encontrou a chave largada ao pé do móvel.
Jogou o objeto branco no chão, ao ritmo da batida do funk carioca. Abriu a porta. O ar entrou como que peneirado. Ela sentou-se exausta no sofá. Fez um carinho no Pichano e o gato respondeu lambendo seus próprios bigodinhos.
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