segunda-feira, outubro 01, 2007
A vida limpa de Benicio
Benicio tinha a vida limpa. Limpa demais. Ele tinha seguido todas as regras da sociedade ocidental. Todas que levariam a seu sucesso. Seus pais pagaram os melhores colégios, ele fez pré-vestibular, curso de inglês e espanhol. Estagiou, engravidou a namorada, abortou, tomou porre, participou de chopada, acampou em Sana. Tudo era redondamente previsto sobre seu céu de estrelas.
Entretanto, por mais que ele tentasse se encaixar como adulto em seus 25 anos, o que ele mais queria era preencher o vazio dos significantes que entravam e saíam de sua vida. 70% dos seus amigos do Orkut ele queria apagar permanentemente. Ele até conseguia chegar perto da tecla DEL, mas seu indicador timidamente recuava, lembrando que as pessoas não eram mais pessoas e sim contatos de networking. Ele seria lembrado. Um dia.
Um dia ele entenderia o que gostaria de ser. Essa inquietação que ele trazia sobre os ombros não era o peso de seu filho morto, que às vezes ele lembrava quando cruzava com a menina de seu prédio. Era a confusão de sua existência, os minutos que ele ainda poderia viver de forma diferente, mas se contentava apertando o start do PS2.
Benicio também gostava de miojo. Mas não comia o pó do tempero porque era cancerígeno, segundo as lendas de supermercado. Quando ele caminhava pelas seções dos produtos de higiene e via as famílias de modelos cheirosos, ele sempre sorria. Sorria porque era engraçado ver a combinação das cores e como as crianças tinham cabelos penteados até debaixo do chuveiro.
Ele não sabia que sua história também era limpa, mas tinha uma ligeira impressão que a vida nada mais era do que uma bucha vegetal. Pelo menos a sua.
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